É uma pena que ainda não tenha versão em português. Mesmo assim, vale a pena conferir The Story of Change, novo filme de Annie Leonard, do projeto The Story of Stuff. De maneira bem simples e em apenas seis minutos, Annie questiona o poder de real mudança do mundo através do ato isolado e individual do consumo. Muito próximo do que venho dizendo nos últimos posts. O mais interessante é que o filme retoma o papel da ação coletiva, fazendo uma rememoração de diversas mudança reais através da atuação consciente e em grupo. Ou seja, o resgate do político versus o ethos romântico e triunfante em nossa sociedade do espírito capitalista.
Obs: neste link tem uma versão legendada não-oficial do filme.
quarta-feira, 25 de julho de 2012
domingo, 24 de junho de 2012
A onipresença do plástico
E a Rio+20 acabou. Não vou fazer um post comentando como o documento final ficou aquém das expectativas de todos, nem tampouco como a diplomacia brasileira agiu de maneira meio açodada e focou muito mais em cumprir a tarefa de produzir um texto do que em conduzir negociações que resultassem em compromissos mais efetivos. Isso seria chover no molhado: todos os veículos de comunicação, dos jornalões aos blogs, de todas as tendências políticas e ideológicas, já comentaram estes aspectos.
O que eu quero comentar é um ponto que me causou um tremendo incômodo: em praticamente todas as fotos de mesas da conferência, lá estava ela, a indefectível, a onipresente garrafinha de água mineral.
Em um evento que discute o uso dos recursos naturais, o impacto da ação do homem sobre o meio ambiente, não é possível que continuem circulando garrafas pet, ostensivamente, em primeiro plano, em quase todas as fotos. E aqui, obviamente, a questão não é as garrafas aparecerem nas fotos, mas estarem presentes nos eventos. Colhi rapidamente no Google algumas imagens (desculpem, fotógrafos, não consegui encontrar o crédito das fotografias) que exemplificam minha crítica.
Claro que todos os participantes da conferência precisavam beber água. Mas precisava ser de garrafa PET? Por que não distribuir, juntamente com as ecobags, no momento do credenciamento dos delegados, um copo de uso individual e permanente, que não fosse virar lixo imediatamente após seu uso? Campeonatos de surf no mundo inteiro adotam esta prática. Como não se pensou em nada semelhante na Rio+20?
(Em algumas reuniões, se podia vislumbrar garrafas de vidro ou jarras de água, como na abertura oficial da conferência. O que impediu que esta prática fosse geral no evento? )
Claro que se pode contra-argumentar que seria muito deselegante cada membro das delegações com seu copinho na mão. Depende do ponto de vista e do que se considera elegância. Não é muito mais deselegante uma garrafa PET de água mineral, com tudo o que ela representa em termos de agressão ao meio ambiente, excesso de consumo, complexidade de tratamento dos resíduos sólidos produzidos pela ação do homem, mercantilização da água, um bem que deve ser comum a todos e vem se tornando uma mercadoria de alto valor internacional, etc, etc, etc?
Toda esta situação nos pontua o quanto a questão da sustentabilidade envolve, também, a mudança de comportamentos e prática culturais. Comportamentos que sem dúvida foram aprendidos ao longo do tempo - só pra ficar num exemplo, quando a ONU foi criada não se servia água em garrafas pet nas reuniões e assembleias... - e que parecem estar profundamente arraigados em nosso cotidiano, seja porque nos trouxeram comodidade, praticidade ou até mesmo por terem barateado o acesso da população a alguns produtos.
Sempre defendo que a sustentabilidade não pode ser uma tarefa jogada no colo do indivíduo, pois o consumo (ou o não-consumo) são apenas a ponta do processo que começa com o uso da matéria-prima e passa essencialmente pela produção. Não estou, portanto, me contradizendo, mas apenas mostrando como, quando precisamos pensar coletivamente, a questão comportamental parece escoar pelo ralo. Ou ficar retida na tampinha da garrafa de plástico. Será que a organização da Rio+20 dirá à sociedade quantas garrafas PET foram utilizadas durante a conferência? E qual o destino dos frascos depois da sua utilização?
Terão sido todos doados para a instalação feita durante a Rio +20 pelo artista Vik Muniz, curiosamente patrocinado por uma das empresas que mais produz resíduos em forma de PET?
Reciclar é a fase final da sequência de atividades recomendadas quando utilizamos objetos, de maneira a reduzir seu impacto no meio ambiente. A sequência inicia com reduzir, segue com reutilização e fecha com a reciclagem.
Curiosamente, quando damos tanta visibilidade à reciclagem, me soa como se nos sentíssemos desobrigados de cumprir as etapas anteriores, que provavelmente são aquelas que provocam a maior mudança tanto de mentalidade quanto de hábitos. Infelizmente, pelo que as fotos nos mostram, esta dificuldade também esteve presente na Rio+20.
O que eu quero comentar é um ponto que me causou um tremendo incômodo: em praticamente todas as fotos de mesas da conferência, lá estava ela, a indefectível, a onipresente garrafinha de água mineral.
Secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon |
Secretário geral da Rio+20 Sha-Zukang |
Ministro das Relações Internacionais, Alexandre Patriota, e Ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira |
Luiz Alberto Figueiredo Machado, Negociador Chefe Brasileiro na Rio + 20, foto de Maria Elisa Franco. |
Claro que todos os participantes da conferência precisavam beber água. Mas precisava ser de garrafa PET? Por que não distribuir, juntamente com as ecobags, no momento do credenciamento dos delegados, um copo de uso individual e permanente, que não fosse virar lixo imediatamente após seu uso? Campeonatos de surf no mundo inteiro adotam esta prática. Como não se pensou em nada semelhante na Rio+20?
(Em algumas reuniões, se podia vislumbrar garrafas de vidro ou jarras de água, como na abertura oficial da conferência. O que impediu que esta prática fosse geral no evento? )
Claro que se pode contra-argumentar que seria muito deselegante cada membro das delegações com seu copinho na mão. Depende do ponto de vista e do que se considera elegância. Não é muito mais deselegante uma garrafa PET de água mineral, com tudo o que ela representa em termos de agressão ao meio ambiente, excesso de consumo, complexidade de tratamento dos resíduos sólidos produzidos pela ação do homem, mercantilização da água, um bem que deve ser comum a todos e vem se tornando uma mercadoria de alto valor internacional, etc, etc, etc?
Toda esta situação nos pontua o quanto a questão da sustentabilidade envolve, também, a mudança de comportamentos e prática culturais. Comportamentos que sem dúvida foram aprendidos ao longo do tempo - só pra ficar num exemplo, quando a ONU foi criada não se servia água em garrafas pet nas reuniões e assembleias... - e que parecem estar profundamente arraigados em nosso cotidiano, seja porque nos trouxeram comodidade, praticidade ou até mesmo por terem barateado o acesso da população a alguns produtos.
Sempre defendo que a sustentabilidade não pode ser uma tarefa jogada no colo do indivíduo, pois o consumo (ou o não-consumo) são apenas a ponta do processo que começa com o uso da matéria-prima e passa essencialmente pela produção. Não estou, portanto, me contradizendo, mas apenas mostrando como, quando precisamos pensar coletivamente, a questão comportamental parece escoar pelo ralo. Ou ficar retida na tampinha da garrafa de plástico. Será que a organização da Rio+20 dirá à sociedade quantas garrafas PET foram utilizadas durante a conferência? E qual o destino dos frascos depois da sua utilização?
Terão sido todos doados para a instalação feita durante a Rio +20 pelo artista Vik Muniz, curiosamente patrocinado por uma das empresas que mais produz resíduos em forma de PET?
Reciclar é a fase final da sequência de atividades recomendadas quando utilizamos objetos, de maneira a reduzir seu impacto no meio ambiente. A sequência inicia com reduzir, segue com reutilização e fecha com a reciclagem.
Curiosamente, quando damos tanta visibilidade à reciclagem, me soa como se nos sentíssemos desobrigados de cumprir as etapas anteriores, que provavelmente são aquelas que provocam a maior mudança tanto de mentalidade quanto de hábitos. Infelizmente, pelo que as fotos nos mostram, esta dificuldade também esteve presente na Rio+20.
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segunda-feira, 18 de junho de 2012
Mercado de crédito de carbono é 3 mil vezes maior que fundos públicos de desenvolvimento sustentável
Enquanto a criação de um fundo global para o desenvolvimento sustentável continua sendo um ponto não equacionado entre os negociadores do Rascunho Zero, texto que será entregue no dia 20 aos chefes de Estado presentes na Rio +20, o mercado de crédito de carbono funciona a todo vapor. Segundo um levantamento da ONG Transparency International, em 2010, os fundos públicos mundiais destinaram cerca de US$ 5 bilhões para projetos de mitigação ou adaptação de impactos das mudanças climáticas. No mesmo período, o mercado de crédito de carbono movimentou US$ 142 bilhões, uma diferença de quase 3.000%.
A diferença entre os dois valores nos mostra um aspecto pouco comentado pela mídia: os governos não investem em projetos voltados para o desenvolvimento sustentável (ou o fazem de forma muito incipiente), mas o mercado já encontrou uma forma de negociar (e lucrar) com a sustentabilidade.
Os dados foram apresentados hoje, dia 18, no 1º Seminário de Monitoramento do Financiamento Climático, promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) , em conjunto com a Transparency International e com o apoio da ESPM/RJ. O evento, que compõe a agenda paralela da Rio+20, contou com a presença de Bruno Andrade, coordenador do Programa para a Integridade em Governança Climática e projetos da Transparencia Mexicana (ligada à Transparency International) e da economista Amyra El Khalili, veterana do mercado de futuro e de capitais.
O objetivo do seminário foi incentivar jornalistas a ir além da superfície e acompanhar com mais atenção um campo que vem crescendo, o do financiamento climático, principalmente o relacionamento com os créditos de carbono. Um tipo de investimento apontado por muitos como a comercialização do direito de poluir.
Em tempos de Rio+20, muito mais que esgotar a pauta do dia, acompanhar as discussões, noticiar as marchas nossas de cada dia - mulheres seminuas, índios, estudantes, ambientalistas - aos jornalistas compete aprofundar o questionamento: fazer perguntas e não se conformar com as respostas apressadas e simplistas.
A diferença entre os dois valores nos mostra um aspecto pouco comentado pela mídia: os governos não investem em projetos voltados para o desenvolvimento sustentável (ou o fazem de forma muito incipiente), mas o mercado já encontrou uma forma de negociar (e lucrar) com a sustentabilidade.
Os dados foram apresentados hoje, dia 18, no 1º Seminário de Monitoramento do Financiamento Climático, promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) , em conjunto com a Transparency International e com o apoio da ESPM/RJ. O evento, que compõe a agenda paralela da Rio+20, contou com a presença de Bruno Andrade, coordenador do Programa para a Integridade em Governança Climática e projetos da Transparencia Mexicana (ligada à Transparency International) e da economista Amyra El Khalili, veterana do mercado de futuro e de capitais.
O objetivo do seminário foi incentivar jornalistas a ir além da superfície e acompanhar com mais atenção um campo que vem crescendo, o do financiamento climático, principalmente o relacionamento com os créditos de carbono. Um tipo de investimento apontado por muitos como a comercialização do direito de poluir.
Em tempos de Rio+20, muito mais que esgotar a pauta do dia, acompanhar as discussões, noticiar as marchas nossas de cada dia - mulheres seminuas, índios, estudantes, ambientalistas - aos jornalistas compete aprofundar o questionamento: fazer perguntas e não se conformar com as respostas apressadas e simplistas.
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terça-feira, 12 de junho de 2012
Viciados em eventos
A um dia da abertura da Rio +20, é impossível ficar "imune" ao evento: qualquer veículo de comunicação dedica no mínimo uma matéria, uma chamada, uma nota, uma reportagenzinha que seja à reunião da Conferência
Outro dia, falando num encontro promovido pela Escola de Comunicação e pelo Instituto de Psicologia da UFRJ, comentei que a cobertura jornalística sobre a sustentabilidade caminha em ondas - sobe aos poucos, atinge um ápice e depois declina, retrocedendo até que se forme nova onda. Uma destas ondas, especialmente no Brasil, teve como crista a ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, que motivou um sem-fim de reportagens jornalísticas sobre o assunto.
No encontro, também levantei que a cobertura jornalística parece estar refém do jornalismo de celebridades, chamado por alguns de jornalismo rosa. Estamos viciados em cobrir eventos e famosos. De repente, parece ser muito mais importante comentar quem veio, quem não virá, quantos participaram, como foi feita a tenda onde acontece o TEDx Rio+20 (acompanhe aqui), do que apontar questões mais fundas. Aprofundar a cobertura implica em conhecer melhor o tema, confrontar versões, fazer apurações mais sofisticadas e detalhadas, buscar conexões entre política, economia, sociedade, cultura. Mas por enquanto não consigo ver nenhuma diferença, nos grandes veículos, entre a cobertura da Rio +20 ou outra cobertura de um grande evento de relevância nacional ou internacional. Como uma Copa do Mundo, Olimpíadas....
Um claro exemplo é o relatório Panorama Ambiental Global, o GEO-5, divulgado no dia 6 de junho pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Embora tenha até sido noticiado por vários jornais, seu conteúdo foi pouco explorado, apesar do grande gancho jornalístico que temos pela frente.
O relatório aponta que apenas quatro dos 90 objetivos ambientais mais importantes acordados internacionalmente nos últimos 40 anos tiveram avanços significativos. Oito objetivos tiveram retrocesso, 40 registraram poucos avanços e 24 praticamente não apresentaram nenhum progresso, além de 14 que não tiveram dados mensuráveis. (Leia mais nesta reportagem do Jornal da Ciência)
Não seria o caso de nossa imprensa trabalhar estes números e confrontá-los com o que se espera da Rio+20? Produzir matérias que mostrem os objetivos alcançados, explorem os motivos do retrocesso de oito destes objetivos? Apurar as condições de assinatura destes acordos e suas variações políticas?
O jornalismo rosa não pode contaminar o jornalismo "verde" - por mais que desgoste desta expressão. Apurar, aprofundar, questionar precisam continuar a ser bandeiras fundamentais para o jornalismo. Seja de cor ele seja!
Outro dia, falando num encontro promovido pela Escola de Comunicação e pelo Instituto de Psicologia da UFRJ, comentei que a cobertura jornalística sobre a sustentabilidade caminha em ondas - sobe aos poucos, atinge um ápice e depois declina, retrocedendo até que se forme nova onda. Uma destas ondas, especialmente no Brasil, teve como crista a ECO 92, realizada no Rio de Janeiro, que motivou um sem-fim de reportagens jornalísticas sobre o assunto.
No encontro, também levantei que a cobertura jornalística parece estar refém do jornalismo de celebridades, chamado por alguns de jornalismo rosa. Estamos viciados em cobrir eventos e famosos. De repente, parece ser muito mais importante comentar quem veio, quem não virá, quantos participaram, como foi feita a tenda onde acontece o TEDx Rio+20 (acompanhe aqui), do que apontar questões mais fundas. Aprofundar a cobertura implica em conhecer melhor o tema, confrontar versões, fazer apurações mais sofisticadas e detalhadas, buscar conexões entre política, economia, sociedade, cultura. Mas por enquanto não consigo ver nenhuma diferença, nos grandes veículos, entre a cobertura da Rio +20 ou outra cobertura de um grande evento de relevância nacional ou internacional. Como uma Copa do Mundo, Olimpíadas....
Um claro exemplo é o relatório Panorama Ambiental Global, o GEO-5, divulgado no dia 6 de junho pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Embora tenha até sido noticiado por vários jornais, seu conteúdo foi pouco explorado, apesar do grande gancho jornalístico que temos pela frente.
O relatório aponta que apenas quatro dos 90 objetivos ambientais mais importantes acordados internacionalmente nos últimos 40 anos tiveram avanços significativos. Oito objetivos tiveram retrocesso, 40 registraram poucos avanços e 24 praticamente não apresentaram nenhum progresso, além de 14 que não tiveram dados mensuráveis. (Leia mais nesta reportagem do Jornal da Ciência)
Não seria o caso de nossa imprensa trabalhar estes números e confrontá-los com o que se espera da Rio+20? Produzir matérias que mostrem os objetivos alcançados, explorem os motivos do retrocesso de oito destes objetivos? Apurar as condições de assinatura destes acordos e suas variações políticas?
O jornalismo rosa não pode contaminar o jornalismo "verde" - por mais que desgoste desta expressão. Apurar, aprofundar, questionar precisam continuar a ser bandeiras fundamentais para o jornalismo. Seja de cor ele seja!
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quarta-feira, 6 de junho de 2012
90% das empresas não incluem sustentabilidade em suas estratégias
Por mais que sejamos bombardeados pela expressão sustentabilidade, produtos verdes, consumo sustentável, etc, etc, etc, surpreendentemente apenas 10% das empresas do mundo estão engajadas e trazendo para a sua agenda de negócios o tema da sustentabilidade. A declaração foi dada hoje, na CBN, pela secretária executiva da Global Compact no Brasil, Yolanda Cerqueira Leite. (Ouça aqui a íntegra da entrevista). A Global Compact é uma iniciativa para empresas que estão comprometidas em alinhar suas operações e estratégias com dez princípios universalmente aceitos nas áreas de direitos humanos, trabalho, meio ambiente e combate à corrupção. (Veja site em inglês e em português).
O curioso é que como pesquisadora da área, observo uma crescente valorização dos atributos VERDE, SUSTENTÁVEL, ECOLÓGICO, LIVRE DE CARBONO (CARBON FREE) na comunicação corporativa, seja ela de produtos ou institucional. Supermercados são bons exemplos do crescimento desta presença de novos valores vinculados à sustentabilidade, desde a questão das sacolinhas plásticas passando pelos orgânicos, produtos de limpeza e até instalações. Ao mesmo tempo, noto um aumento da pressão por parte de algumas corporações para a adoção da sustentabilidade como um valor fundamental para os negócios. Mas pela entrevista da secretária executiva da Global Compact, esta realidade atinge uma pequena parcela do mundo empresarial. Não vou questionar aspectos como os que Yolanda Leite aponta: se não houver uma preocupação com o uso dos recursos naturais, no futuro não haverá negócios (e nem empresas). O que me chamou a atenção na notícia foi constatar que todo o com o esforço de construção de identidade através da incorporação de atributos verdes no fundo a maioria das empresas parece estar embarcando nesta "nova onda" e se limitando a praticar greenwashing.
A propósito: ontem foi o Dia Mundial do Meio Ambiente. O Governo Federal lançou um pacote verde, que, entre outras medidas, cria duas unidades de conservação, uma no Paraná, para proteção da mata atlântica, e outra no Rio Grande do Norte, para preservação da caatinga e de cavidades naturais subterrâneas. Há ainda um decreto estabelecendo diretrizes de desenvolvimento sustentável nas contratações e compras efetuadas pelos órgãos da administração federal. Muitos estão reclamando que o pacote foi tímido e de pouco alcance. Hoje as compras do governo equivalem a cerca de 16% do Produto Interno Bruto. Em 2010, este valor chegou a quase R$ 70 bilhões. Se de fato as diretrizes sustentáveis forem seguidas pelo Executivo Federal, podemos ver uma transformação de grande impacto. A conferir.
O curioso é que como pesquisadora da área, observo uma crescente valorização dos atributos VERDE, SUSTENTÁVEL, ECOLÓGICO, LIVRE DE CARBONO (CARBON FREE) na comunicação corporativa, seja ela de produtos ou institucional. Supermercados são bons exemplos do crescimento desta presença de novos valores vinculados à sustentabilidade, desde a questão das sacolinhas plásticas passando pelos orgânicos, produtos de limpeza e até instalações. Ao mesmo tempo, noto um aumento da pressão por parte de algumas corporações para a adoção da sustentabilidade como um valor fundamental para os negócios. Mas pela entrevista da secretária executiva da Global Compact, esta realidade atinge uma pequena parcela do mundo empresarial. Não vou questionar aspectos como os que Yolanda Leite aponta: se não houver uma preocupação com o uso dos recursos naturais, no futuro não haverá negócios (e nem empresas). O que me chamou a atenção na notícia foi constatar que todo o com o esforço de construção de identidade através da incorporação de atributos verdes no fundo a maioria das empresas parece estar embarcando nesta "nova onda" e se limitando a praticar greenwashing.
A propósito: ontem foi o Dia Mundial do Meio Ambiente. O Governo Federal lançou um pacote verde, que, entre outras medidas, cria duas unidades de conservação, uma no Paraná, para proteção da mata atlântica, e outra no Rio Grande do Norte, para preservação da caatinga e de cavidades naturais subterrâneas. Há ainda um decreto estabelecendo diretrizes de desenvolvimento sustentável nas contratações e compras efetuadas pelos órgãos da administração federal. Muitos estão reclamando que o pacote foi tímido e de pouco alcance. Hoje as compras do governo equivalem a cerca de 16% do Produto Interno Bruto. Em 2010, este valor chegou a quase R$ 70 bilhões. Se de fato as diretrizes sustentáveis forem seguidas pelo Executivo Federal, podemos ver uma transformação de grande impacto. A conferir.
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terça-feira, 24 de abril de 2012
Sobre os limites do consumerismo
Ontem foi feriado no Rio de Janeiro. Com o tempo chuvoso, os shoppings da cidade lotaram. Parecia que quem não estava numa procissão em homenagem a São Jorge tinha resolvido ir ao cinema num grande centro comercial. Eu me incluo neste segundo grupo, mas acabei nem conseguindo ver um filme, de tanta gente que se embolava tentando comprar o ingresso, entrar na sala de projeção e pegar pipoca.
O remédio pra não frustrar a filha que queria MUITO ir ao cinema foi dar uma volta pelos corredores do shopping, parando aqui e ali. Um programa que passa longe de estar entre os meus favoritos, mas estoicamente sobrevivi.
Aí passei pela frente da Zara, e não resisti a entrar para dar uma olhada. Não entrava numa loja da marca desde a denúncia de trabalho escravo na cadeia de produção das roupas, no ano passado (veja o caso aqui), e fiquei curiosa em verificar se este fato teria afetado de alguma maneira a frequencia de consumidores.
A minha, pelo menos, havia afetado, ainda mais depois que a empresa só assinou um termo de ajuste de conduta com o Ministério Público do Trabalho depois de muita negociação (confira aqui). E eu achava que muitas pessoas também estavam boicotando a Zara.
Total engano. A loja estava tão cheia, mas tão lotada, que mal dava para ver as roupas expostas. Algumas prateleiras já mostravam sinais de desabastecimento. Nas ilhas centrais, pilhas de casaquinhos de cashmere em várias cores eram disputadas por mãos sedentas.
O panorama que estava diante de mim parecia inacreditavelmente, especialmente de todo o escândalo em torno da denúncia, que começou com uma reportagem do programa de televisão A Liga da Band e provocou um grande alvoroço nas redes sociais. Segundo a MITI Inteligência, que analisou os temas de mais relevância nas redes sociais em 2011, logo após a matéria, o tema entrou no Trending Topics do Twitter (assunto mais citado) e teve mais de 50 mil menções nas primeiras 24 horas, sendo nove mil só na primeira hora.
Tanto agito, porém, não se sustentou, e oito meses após a denúncia a Zara vende e fatura como nunca peças da coleção desenvolvida especialmente para o hemisfério sul (esse sim, podemos dizer que seja um efeito colateral da crise instalada com a descoberta de utilização de mão-de-obra escrava nas confecções fornecedoras da marca, já que a Zara adota um modelo global, distribuindo as mesmas peças em suas mais de cinco mil lojas no mundo, e optou por produzir roupas tropicalizadas.
O que me levou a pensar no alcance real do consumerismo. A ideia que os consumidores podem punir ou premiar as empresas éticas, responsáveis nos campos sociais e ambientais, sinceramente, não me parece tão real quanto nos artigos acadêmicos.
Muitos pesquisadores da área de consumo irão discordar de mim. Mas até hoje não vi exemplos sustentáveis (no sentido antigo do termo, ou seja, que se sustentam) de ações de boicote a produtos e empresas no BRASIL. Nem tampouco ações políticas de fato. De um modo geral, o que vemos são casos nos Estados Unidos, na Europa. Por aqui, as pressões levam as empresas a promover mudanças, muito mais preocupadas com os arranhões na sua imagem habilmente construída ao longo de anos, do que com suas práticas reais na produção e comercialização de seus bens.
Depois que passa o furacão, parece que o consumidor passa a borracha também.
Um texto interessante foi escrito por Leonardo Sakamoto, jornalista, doutor em Ciência Política, coordenador da ONG Repórter Brasil, na época da denúncia (clique para ler). Ele se pergunta se saber a origem das coisas muda os hábitos de consumo. Ainda não sei a resposta. Mas estou longe do romantismo idealista de quem credita ao consumerismo um papel que ele não desempenha entre nós.
O remédio pra não frustrar a filha que queria MUITO ir ao cinema foi dar uma volta pelos corredores do shopping, parando aqui e ali. Um programa que passa longe de estar entre os meus favoritos, mas estoicamente sobrevivi.
Aí passei pela frente da Zara, e não resisti a entrar para dar uma olhada. Não entrava numa loja da marca desde a denúncia de trabalho escravo na cadeia de produção das roupas, no ano passado (veja o caso aqui), e fiquei curiosa em verificar se este fato teria afetado de alguma maneira a frequencia de consumidores.
A minha, pelo menos, havia afetado, ainda mais depois que a empresa só assinou um termo de ajuste de conduta com o Ministério Público do Trabalho depois de muita negociação (confira aqui). E eu achava que muitas pessoas também estavam boicotando a Zara.
Total engano. A loja estava tão cheia, mas tão lotada, que mal dava para ver as roupas expostas. Algumas prateleiras já mostravam sinais de desabastecimento. Nas ilhas centrais, pilhas de casaquinhos de cashmere em várias cores eram disputadas por mãos sedentas.
O panorama que estava diante de mim parecia inacreditavelmente, especialmente de todo o escândalo em torno da denúncia, que começou com uma reportagem do programa de televisão A Liga da Band e provocou um grande alvoroço nas redes sociais. Segundo a MITI Inteligência, que analisou os temas de mais relevância nas redes sociais em 2011, logo após a matéria, o tema entrou no Trending Topics do Twitter (assunto mais citado) e teve mais de 50 mil menções nas primeiras 24 horas, sendo nove mil só na primeira hora.
Tanto agito, porém, não se sustentou, e oito meses após a denúncia a Zara vende e fatura como nunca peças da coleção desenvolvida especialmente para o hemisfério sul (esse sim, podemos dizer que seja um efeito colateral da crise instalada com a descoberta de utilização de mão-de-obra escrava nas confecções fornecedoras da marca, já que a Zara adota um modelo global, distribuindo as mesmas peças em suas mais de cinco mil lojas no mundo, e optou por produzir roupas tropicalizadas.
O que me levou a pensar no alcance real do consumerismo. A ideia que os consumidores podem punir ou premiar as empresas éticas, responsáveis nos campos sociais e ambientais, sinceramente, não me parece tão real quanto nos artigos acadêmicos.
Muitos pesquisadores da área de consumo irão discordar de mim. Mas até hoje não vi exemplos sustentáveis (no sentido antigo do termo, ou seja, que se sustentam) de ações de boicote a produtos e empresas no BRASIL. Nem tampouco ações políticas de fato. De um modo geral, o que vemos são casos nos Estados Unidos, na Europa. Por aqui, as pressões levam as empresas a promover mudanças, muito mais preocupadas com os arranhões na sua imagem habilmente construída ao longo de anos, do que com suas práticas reais na produção e comercialização de seus bens.
Depois que passa o furacão, parece que o consumidor passa a borracha também.
Um texto interessante foi escrito por Leonardo Sakamoto, jornalista, doutor em Ciência Política, coordenador da ONG Repórter Brasil, na época da denúncia (clique para ler). Ele se pergunta se saber a origem das coisas muda os hábitos de consumo. Ainda não sei a resposta. Mas estou longe do romantismo idealista de quem credita ao consumerismo um papel que ele não desempenha entre nós.
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sexta-feira, 20 de abril de 2012
Rio+20: em busca de vozes dissonantes
Enquanto a grande mídia se divide entre louvar a iniciativa, buscar comparativos entre as duas edições - ECO 92 e Rio+20, e abordar os aspectos relacionados com a organização do evento - quem vem, quem não vem, onde as pessoas vão ficar hospedadas, como será o trânsito, o que a cidade está fazendo para receber os visitantes, etc - a discussão em torno do conteúdo da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (e da sua efetividade) parece estar reduzida às páginas de veículos com um perfil mais analítico, como é o caso da revista Caros Amigos.
A edição nº 180, que está nas bancas, quer responder à pergunta: O que esperar da Rio+20 e como escapar do discurso da hipocrisia ambiental? Para isso, a jornalista Barbara Mengardo faz uma entrevista com o pensador brasileiro radicado na França Michael Löwy, o qual levanta algumas questões sobre a efetividade da conferência.
Entre outras questões, Löwy critica a Economia Verde, um dos pontos que vêm sendo esperados como um dos principais resultados da Rio +20. Vale a pena ler a entrevista, para ajudar a formar um pensamento crítico e funcionar como um contraponto para os aspectos que ainda precisam ser incluídos nas inúmeras reportagens que começam a pipocar sobre o tema.
Siga abaixo a entrevista, reproduzida do site da Caros Amigos:
Michael Löwy critica Rio+20 e a propaganda da 'economia verde'
Caros Amigos - O que você espera da Rio+20, tanto do ponto de vista das discussões quanto da eficácia de possíveis decisões tomadas?
Michael Löwy - Nada! Ou, para ser caridoso, muito pouco, pouquíssimo… As discussões já estão formatadas pelo tal "Draft Zero", que como bem diz (involuntariamente) seu nome, é uma nulidade, um zero à esquerda. E a eficácia, nenhuma, já que não haverá nada de concreto como obrigação internacional. Como nas conferências internacionais sobre o câmbio climático em Copenhagen, Cancun e Durban, o mais provável é que a montanha vai parir um rato: vagas promessas, discursos, e, sobretudo, bons negócios 'verdes". Como dizia Ban-Ki-Moon, o secretário das Nações Unidas - que não tem nada de revolucionário – em setembro 2009, "estamos com o pé colado no acelerador e nos precipitamos ao abismo”. Discussões e iniciativas interessantes existirão sobretudo nos fóruns Alternativos, na Contra-Conferência organizada pelo Fórum Social Mundial e pelos movimentos sociais e ecológicos.
A edição nº 180, que está nas bancas, quer responder à pergunta: O que esperar da Rio+20 e como escapar do discurso da hipocrisia ambiental? Para isso, a jornalista Barbara Mengardo faz uma entrevista com o pensador brasileiro radicado na França Michael Löwy, o qual levanta algumas questões sobre a efetividade da conferência.
Entre outras questões, Löwy critica a Economia Verde, um dos pontos que vêm sendo esperados como um dos principais resultados da Rio +20. Vale a pena ler a entrevista, para ajudar a formar um pensamento crítico e funcionar como um contraponto para os aspectos que ainda precisam ser incluídos nas inúmeras reportagens que começam a pipocar sobre o tema.
Siga abaixo a entrevista, reproduzida do site da Caros Amigos:
Michael Löwy critica Rio+20 e a propaganda da 'economia verde'
Pesquisador diz não esperar nada da cúpula e critica a 'economia verde'
Da Redação
Em junho, o Brasil sedia a Rio+20, a cúpula mundial de meio ambiente, um dos temas da edição 180 de Caros Amigos, que está nas bancas. A cúpula já divide opiniões, como a do pesquisador Michael Löwy, um dos entrevistados da reportagem publicada na revista.
Confira abaixo a entrevista de Löwy, feita pela jornalista Bárbara Mengardo. Leia a reportagem completa sobre a Rio+20 na edição nas bancas (veja aqui).
Caros Amigos - O que você espera da Rio+20, tanto do ponto de vista das discussões quanto da eficácia de possíveis decisões tomadas?
Michael Löwy - Nada! Ou, para ser caridoso, muito pouco, pouquíssimo… As discussões já estão formatadas pelo tal "Draft Zero", que como bem diz (involuntariamente) seu nome, é uma nulidade, um zero à esquerda. E a eficácia, nenhuma, já que não haverá nada de concreto como obrigação internacional. Como nas conferências internacionais sobre o câmbio climático em Copenhagen, Cancun e Durban, o mais provável é que a montanha vai parir um rato: vagas promessas, discursos, e, sobretudo, bons negócios 'verdes". Como dizia Ban-Ki-Moon, o secretário das Nações Unidas - que não tem nada de revolucionário – em setembro 2009, "estamos com o pé colado no acelerador e nos precipitamos ao abismo”. Discussões e iniciativas interessantes existirão sobretudo nos fóruns Alternativos, na Contra-Conferência organizada pelo Fórum Social Mundial e pelos movimentos sociais e ecológicos.
CA - Desde a Eco 92, houve mudanças na maneira como os estados lidam com temas como mudanças climáticas, preservação das florestas, água e ar, fontes energéticas alternativas, etc.? Se sim, o quão profundas foram essas mudanças?
ML - Mudanças muito superficiais! Enquanto a crise ecológica se agrava, os governos - para começar o dos Estados Unidos e dos demais países industrializados do Norte, principais responsáveis do desastre ambiental - "lidaram com o tema", desenvolveram, em pequena escala, fontes energéticas alternativas, e introduziram "mecanismos de mercado" perfeitamente ineficazes para controlar as emissões de CO2. No fundo, continua o famoso "buzines as usual", que, segundo cálculo dos cientistas, nos levara a temperaturas de 4° ou mais graus nas próximas décadas.
ML - Mudanças muito superficiais! Enquanto a crise ecológica se agrava, os governos - para começar o dos Estados Unidos e dos demais países industrializados do Norte, principais responsáveis do desastre ambiental - "lidaram com o tema", desenvolveram, em pequena escala, fontes energéticas alternativas, e introduziram "mecanismos de mercado" perfeitamente ineficazes para controlar as emissões de CO2. No fundo, continua o famoso "buzines as usual", que, segundo cálculo dos cientistas, nos levara a temperaturas de 4° ou mais graus nas próximas décadas.
CA - Em comparação a 1992, a sociedade está muito mais ciente da necessidade de proteção do meio ambiente. Esse fato poderá influir positivamente nas discussões da Rio+20?
ML - Esta sim é uma mudança positiva! A opinião pública, a "sociedade civil", amplos setores da população, tanto no Norte como no Sul, está cada vez mais consciente de necessidade de proteger o meio ambiente - não para "salvar a Terra" - nosso planeta não está em perigo - mas para salvar a vida humana (e a de muitas outras espécies) nesta Terra. Infelizmente, os governos, empresas e instituições financeiras internacionais representados no Rio+20 são pouco sensíveis à inquietude da população, que buscam tranquilizar com discursos sobre a pretensa "economia verde". Entre as poucas exceções, o governo boliviano de Evo Morales.
ML - Esta sim é uma mudança positiva! A opinião pública, a "sociedade civil", amplos setores da população, tanto no Norte como no Sul, está cada vez mais consciente de necessidade de proteger o meio ambiente - não para "salvar a Terra" - nosso planeta não está em perigo - mas para salvar a vida humana (e a de muitas outras espécies) nesta Terra. Infelizmente, os governos, empresas e instituições financeiras internacionais representados no Rio+20 são pouco sensíveis à inquietude da população, que buscam tranquilizar com discursos sobre a pretensa "economia verde". Entre as poucas exceções, o governo boliviano de Evo Morales.
CA - Como a destruição do meio-ambiente relaciona-se com a desigualdade social?
ML - As primeiras vítimas dos desastres ecológicos são as camadas sociais exploradas e oprimidas, os povos do Sul e em particular as comunidades indígenas e camponesas que vêem suas terras, suas florestas e seus rios poluídos, envenenados e devastados pelas multinacionais do petróleo e das minas, ou pelo agronegócio da soja, do óleo de palma e do gado. Há alguns anos, Lawrence Summers, economista americano, num informe interno para o Banco Mundial, explicava que era lógico, do ponto de vista de uma economia racional, enviar as produções tóxicas e poluidoras para os países pobres, onde a vida humana tem um preço bem inferior: simples questão de cálculo de perdas e lucros.
ML - As primeiras vítimas dos desastres ecológicos são as camadas sociais exploradas e oprimidas, os povos do Sul e em particular as comunidades indígenas e camponesas que vêem suas terras, suas florestas e seus rios poluídos, envenenados e devastados pelas multinacionais do petróleo e das minas, ou pelo agronegócio da soja, do óleo de palma e do gado. Há alguns anos, Lawrence Summers, economista americano, num informe interno para o Banco Mundial, explicava que era lógico, do ponto de vista de uma economia racional, enviar as produções tóxicas e poluidoras para os países pobres, onde a vida humana tem um preço bem inferior: simples questão de cálculo de perdas e lucros.
Por outro lado, o mesmo sistema econômico e social - temos que chamá-lo por seu nome e apelido: o capitalismo – que destrói o meio-ambiente é responsável pelas brutais desigualdades sociais entre a oligarquia financeira dominante e a massa do "pobretariado". São os dois lados da mesma moeda, expressão de um sistema que não pode existir sem expansão ao infinito, sem acumulação ilimitada - e portanto sem devastar a natureza – e sem produzir e reproduzir a desigualdade entre explorados e exploradores.
CA - Estamos em meio a uma crise do capital. Quais as suas consequências ambientais e qual o papel do ecossocialismo nesse contexto?
ML - A crise financeira internacional tem servido de pretexto aos vários governos ao serviço do sistema de empurrar para "mais tarde" as medidas urgentes necessárias para limitar as emissões de gases com efeito de serra. A urgência do momento - um momento que já dura há alguns anos - é salvar os bancos, pagar a dívida externa (aos mesmos bancos), "restabelecer os equilíbrio contábeis", "reduzir as despesas públicas". Não há dinheiro disponível para investir nas energias alternativas ou para desenvolver os transportes coletivos.
O ecossocialismo é uma resposta radical tanto à crise financeira, quanto à crise ecológica. Ambas são a expressão de um processo mais profundo: a crise do paradigma da civilização capitalista industrial moderna. A alternativa ecossocialista significa que os grandes meios de produção e de crédito são expropriados e colocados a serviço da população. As decisões sobre a produção e o consumo não serão mais tomadas por banqueiros, managers de multinacionais, donos de poços de petróleo e gerentes de supermercados, mas pela própria população, depois de um debate democrático, em função de dois critérios fundamentais: a produção de valores de uso para satisfazer as necessidades sociais e a preservação do meio ambiente.
ML - A crise financeira internacional tem servido de pretexto aos vários governos ao serviço do sistema de empurrar para "mais tarde" as medidas urgentes necessárias para limitar as emissões de gases com efeito de serra. A urgência do momento - um momento que já dura há alguns anos - é salvar os bancos, pagar a dívida externa (aos mesmos bancos), "restabelecer os equilíbrio contábeis", "reduzir as despesas públicas". Não há dinheiro disponível para investir nas energias alternativas ou para desenvolver os transportes coletivos.
O ecossocialismo é uma resposta radical tanto à crise financeira, quanto à crise ecológica. Ambas são a expressão de um processo mais profundo: a crise do paradigma da civilização capitalista industrial moderna. A alternativa ecossocialista significa que os grandes meios de produção e de crédito são expropriados e colocados a serviço da população. As decisões sobre a produção e o consumo não serão mais tomadas por banqueiros, managers de multinacionais, donos de poços de petróleo e gerentes de supermercados, mas pela própria população, depois de um debate democrático, em função de dois critérios fundamentais: a produção de valores de uso para satisfazer as necessidades sociais e a preservação do meio ambiente.
CA - O “rascunho zero” da Rio+20 cita diversas vezes o termo "economia verde", mas não traz uma definição para essa expressão. Na sua opinião, o que esse termo pode significar? Seria esse conceito suficiente para deter a destruição do planeta e as mudanças climáticas?
ML - Não é por acaso que os redatores do tal "rascunho" preferem deixar o termo sem definição, bastante vago. A verdade é que não existe “economia” em geral: ou se trata de uma economia capitalista, ou de uma economia não-capitalista. No caso, a "economia verde" do rascunho não é outra coisa do que uma economia capitalista de mercado que busca traduzir em termos de lucro e rentabilidade algumas propostas técnicas "verdes" bastante limitadas. Claro, tanto melhor se alguma empresa trata de desenvolver a energia eólica ou fotovoltaica, mas isto não trará modificações substanciais se não for amplamente subvencionado pelos estados, desviando fundos que agora servem à indústria nuclear, e se não for acompanhado de drásticas reduções no consumo das energias fósseis. Mas nada disto é possível sem romper com a lógica de competição mercantil e rentabilidade do capital. Outras propostas "técnicas" são bem piores: por exemplo, os famigerados "biocombustíveis", que como bem o diz Frei Betto, deveriam ser chamados "necrocombustiveis", pois tratam de utilizar os solos férteis para produzir uma pseudo-gasolina "verde", para encher os tanques dos carros - em vez de comida para encher o estômago dos famintos da terra.
ML - Não é por acaso que os redatores do tal "rascunho" preferem deixar o termo sem definição, bastante vago. A verdade é que não existe “economia” em geral: ou se trata de uma economia capitalista, ou de uma economia não-capitalista. No caso, a "economia verde" do rascunho não é outra coisa do que uma economia capitalista de mercado que busca traduzir em termos de lucro e rentabilidade algumas propostas técnicas "verdes" bastante limitadas. Claro, tanto melhor se alguma empresa trata de desenvolver a energia eólica ou fotovoltaica, mas isto não trará modificações substanciais se não for amplamente subvencionado pelos estados, desviando fundos que agora servem à indústria nuclear, e se não for acompanhado de drásticas reduções no consumo das energias fósseis. Mas nada disto é possível sem romper com a lógica de competição mercantil e rentabilidade do capital. Outras propostas "técnicas" são bem piores: por exemplo, os famigerados "biocombustíveis", que como bem o diz Frei Betto, deveriam ser chamados "necrocombustiveis", pois tratam de utilizar os solos férteis para produzir uma pseudo-gasolina "verde", para encher os tanques dos carros - em vez de comida para encher o estômago dos famintos da terra.
CA - Quem seriam os principais agentes na luta por uma sociedade mais verde, o governo, a iniciativa privada, ONGs, movimentos sociais, enfim?
ML - Salvo pouquíssimas exceções, não há muito a esperar dos governos e da iniciativa privada: nos últimos 20 anos, desde a Rio-92, demonstraram amplamente sua incapacidade de enfrentar os desafios da crise ecológica. Não se trata só de má-vontade, cupidez, corrupção, ignorância e cegueira: tudo isto existe, mas o problema é mais profundo: é o próprio sistema que é incompatível com as radicais e urgentes transformações necessárias.
ML - Salvo pouquíssimas exceções, não há muito a esperar dos governos e da iniciativa privada: nos últimos 20 anos, desde a Rio-92, demonstraram amplamente sua incapacidade de enfrentar os desafios da crise ecológica. Não se trata só de má-vontade, cupidez, corrupção, ignorância e cegueira: tudo isto existe, mas o problema é mais profundo: é o próprio sistema que é incompatível com as radicais e urgentes transformações necessárias.
A única esperança então são os movimentos socais e aquelas ONGs que são ligadas a estes movimentos (outras são simples "conselheiros verdes" do capital). O movimento camponês - Via Campesina -, os movimentos indígenas e os movimentos de mulheres estão na primeira linha deste combate; mas também participam, em muitos países, os sindicatos, as redes ecológicas, a juventude escolar, os intelectuais, várias correntes da esquerda. O Fórum Social Mundial é uma das manifestações desta convergência na luta por um "outro mundo possível", onde o ar, a água, a vida, deixarão de ser mercadorias.
CA - Como você analisa a maneira como a questão ambiental vem sendo tratada pela mídia?
ML - Geralmente de maneira superficial, mas existe um número considerável de jornalistas com sensibilidade ecológica, tanto na mídia dominante como nos meios de comunicação alternativos. Infelizmente uma parte importante da mídia ignora os combates sócio-ecológicos e toda crítica radical ao sistema.
ML - Geralmente de maneira superficial, mas existe um número considerável de jornalistas com sensibilidade ecológica, tanto na mídia dominante como nos meios de comunicação alternativos. Infelizmente uma parte importante da mídia ignora os combates sócio-ecológicos e toda crítica radical ao sistema.
CA - Você acredita que, atualmente, em prol da preservação do meio ambiente é deixada apenas para o cidadão a responsabilidade pela destruição do planeta e não para as empresas? Em São Paulo, por exemplo, temos que comprar sacolinhas plásticas biodegradáveis, enquanto as empresas se utilizam do fato de serem supostamente "verdes" como ferramenta de marketing.
ML - Concordo com esta crítica. Os responsáveis do desastre ambiental tratam de culpabilizar os cidadãos e criam a ilusão de que bastaria que os indivíduos tivessem comportamentos mais ecológicos para resolver o problema. Com isso tratam de evitar que as pessoas coloquem em questão o sistema capitalista, principal responsável da crise ecológica. Claro, é importante que cada indivíduo aja de forma a reduzir a poluição, por exemplo, preferindo os transportes coletivos ao carro individual. Mas sem transformações macro-econômicas, ao nível do aparelho de produção, não será possível brecar a corrida ao abismo.
ML - Concordo com esta crítica. Os responsáveis do desastre ambiental tratam de culpabilizar os cidadãos e criam a ilusão de que bastaria que os indivíduos tivessem comportamentos mais ecológicos para resolver o problema. Com isso tratam de evitar que as pessoas coloquem em questão o sistema capitalista, principal responsável da crise ecológica. Claro, é importante que cada indivíduo aja de forma a reduzir a poluição, por exemplo, preferindo os transportes coletivos ao carro individual. Mas sem transformações macro-econômicas, ao nível do aparelho de produção, não será possível brecar a corrida ao abismo.
CA - Quais as diferenças nas propostas que querem, do ponto de vista ambiental, realizar apenas reformas no capitalismo e as que propõem mudanças estruturais ou mesmo a adoção de medidas mais "verdes" dentro de outro sistema econômico?
ML - O reformismo "verde" aceita as regras da "economia de mercado", isto é, do capitalismo; busca soluções que seja aceitáveis, ou compatíveis, com os interesses de rentabilidade, lucro rápido, competitividade no mercado e "crescimento" ilimitado das oligarquias capitalistas. Isto não quer dizer que os partidários de uma alternativa radical, como o ecossocialismo, não lutam por reformas que permitam limitar o estrago: proibição dos transgênicos, abandono da energia nuclear, desenvolvimento das energias alternativas, defesa de uma floresta tropical contra multinacionais do petróleo (Parque Yasuni!), expansão e gratuidade dos transportes coletivos, transferência do transporte de mercadorias do caminhão para o trem, etc. O objetivo do ecossocialismo é o de uma transformação radical, a transição para um novo modelo de civilização, baseado em valores de solidariedade, democracia participativa, preservação do meio ambiente. Mas a luta pelo ecossocialismo começa aqui e agora, em todas as lutas sócio-ecológicas concretas que se enfrentam, de uma forma ou de outra, com o sistema.
ML - O reformismo "verde" aceita as regras da "economia de mercado", isto é, do capitalismo; busca soluções que seja aceitáveis, ou compatíveis, com os interesses de rentabilidade, lucro rápido, competitividade no mercado e "crescimento" ilimitado das oligarquias capitalistas. Isto não quer dizer que os partidários de uma alternativa radical, como o ecossocialismo, não lutam por reformas que permitam limitar o estrago: proibição dos transgênicos, abandono da energia nuclear, desenvolvimento das energias alternativas, defesa de uma floresta tropical contra multinacionais do petróleo (Parque Yasuni!), expansão e gratuidade dos transportes coletivos, transferência do transporte de mercadorias do caminhão para o trem, etc. O objetivo do ecossocialismo é o de uma transformação radical, a transição para um novo modelo de civilização, baseado em valores de solidariedade, democracia participativa, preservação do meio ambiente. Mas a luta pelo ecossocialismo começa aqui e agora, em todas as lutas sócio-ecológicas concretas que se enfrentam, de uma forma ou de outra, com o sistema.
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quarta-feira, 11 de abril de 2012
Embalando a sustentabilidade
Como falar com o consumidor final sobre os esforços da empresa em relação à sustentabilidade? Num mundo em que a atenção está cada vez mais fragmentada, dispersa por várias mídias e formatos, em que os canais tradicionais da informação competem o tempo todo com mídias sociais, "posts" de amigos virtuais e mensagens curtas e dinâmicas, com certeza não é apelando para a boa e velha propaganda - "o anúncio" que o fabricante vai conseguir isso.
Uma saída que a indústria da moda tem adotado com frequencia é a produção de embalagens que explorem o conceito de sustentabilidade, e a introdução de pequenas tags informativas, que abordam as características do produto.
Alguns exemplos de fabricantes de roupas esportivas, um ramo da indústria que vem explorando bastante a vertente ecológica de suas peças :
Embalagem da Puma para uma camiseta - além de ser biodegradável, o saco usa menos material porque a camiseta foi dobrada ao meio.
Uma saída que a indústria da moda tem adotado com frequencia é a produção de embalagens que explorem o conceito de sustentabilidade, e a introdução de pequenas tags informativas, que abordam as características do produto.
Alguns exemplos de fabricantes de roupas esportivas, um ramo da indústria que vem explorando bastante a vertente ecológica de suas peças :
Embalagem da Puma para uma camiseta - além de ser biodegradável, o saco usa menos material porque a camiseta foi dobrada ao meio.
"Sou metade do saco que costumava ser" - brincando com a música do Nirvana, "I'm half the man I used to be"
A mesma camiseta recebeu uma etiqueta com os aspectos ecológicos que formariam uma eco-tabela:
frente
verso
O uso da etiqueta presa à roupa para ressaltar os atributos ecológicos do produto também é utilizada pela Marmot, outra fabricante de vestimentas esportivas. Desta vez, para ressaltar que utiliza o Ecofren, uma fibra produzida a partir de garrafas pet recicláveis (clique aqui para conhecer o processo de produção do fio)
As duas etiquetas vistas de frente.
Verso da tag da Ecofren, que destaca a economia de energia e de óleo gerada pela reciclagem das pets.
Etiqueta da Marmot na parte de trás: destaque para o uso de papel reciclado e de tinta à base de soja.
E por aí temos vários outros exemplos, que demonstram que a indústria vem se dedicando a encontrar canais de comunicação mais diretos com seus públicos consumidores para destacar os atributos sustentáveis na produção.
A questão que fica é que a produção caminha para ser mais ecológica. Mas e quanto ao consumo? O desenvolvimento sustentável é apenas produzir de maneira menos agressiva ou implica também em repensar a maneira de consumir, de usar e de descartar?
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segunda-feira, 2 de abril de 2012
No meio do caminho tinha uma pedra...
Cadê a estação de reciclagem que tava aqui? |
Além de longe da entrada da loja, situada num canto extremo do estacionamento, é impossível chegar até a estação, já que a frente dela está completamente bloqueada.
Fazer peças publicitárias bonitas - todas em papel reciclado, em tons de verde e com imagens alusivas à reciclagem, por exemplo, é realmente fácil. O difícil é seguir, na prática, o que o discurso apregoa. Ou melhor: fazer greenwashing é extremamente comum. O que sem dúvida não contribui para o crescimento da consciência ambiental entre brasileiros.
Recentemente, o Jornal O Globo fez uma série de reportagens sobre o tratamento dado ao lixo no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, e concluiu que a reciclagem ainda é praticamente uma utopia no país.
Muitos colocam a culpa no consumidor, na população que jogaria lixo em qualquer lugar. Mas estes argumentos caem por terra quando encontramos uma situação como a da foto. Dá pra querer reciclar o lixo deste jeito?
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terça-feira, 27 de março de 2012
O Tao da Física no Brasil
Frijtof Capra |
Ao longo destes quase 40 anos, desde a publicação de O Tao, Capra ampliou sua visão sistêmica, o que o aproximou exatamente da sustentabilidade. Sua teoria dos sistemas vivos, que estão em conexão e se relacionam como um fator adicional importante para a formação do todo, fornece um quadro teórico importante para a ecologia. Para conhecer mais, vale acessar o site do físico e pensador.
Pois nesta quarta, 28/3, Frijtof Capra estará no Rio de Janeiro, falando num evento patrocinado por um banco, cujo tema será o Brasil como líder de um modelo de desenvolvimento economicamente viável, ambientalmente equilibrado e socialmente justo.
Segundo a organização do evento, Capra trará exemplos práticos de aplicação do conceito de crescimento qualitativo e mostrará como a alfabetização ecológica e a nova ciência da complexidade podem contribuir para esse processo. Alfabetização ecológica é o objetivo da escola que ele fundou e dirige em Berkeley, na Califórnia.
Além do físico, o evento contará com a participação do jornalista Ricardo Voltolini, especializado em sustentabilidade, e do fundador da consultoria Amana-Key, Oscar Motomura.
O evento é gratuito, mas as inscrições já se encerraram. O jeito é acompanhar a transmissão online, a partir das 18h40min, acessando este link: http://sustentabilidade.santander.com.br/default.aspx.
Estarão disponíveis dos links, um com captação do áudio em inglês e outro com a tradução simultânea para o português.
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sexta-feira, 16 de março de 2012
Estimulando uso do transporte coletivo
Agora que o Ecad voltou atrás na sua cobrança absurda de direitos autorais sobre blogueiros que postam vídeos, me animei a mostrar aqui uma campanha inteligente para estimular o uso de transporte coletivo.
Foi desenvolvida para a empresa De Lijn, da Bélgica, que engloba ônibus e trens urbanos.
Veja mais no link: http://www.delijn.be/over/campagnes/imagocampagne.htm
Claro que por mais bonitinha e criativa que seja uma propaganda, ela não valerá muito (especialmente do ponto de vista da comunicação para a sustentabilidade) se o produto ou serviço em questão não tiver qualidade, oferta compatível com as necessidades da população, disponibilidade, acesso, etc.
Ou seja, autoridades, metrô carioca, trens urbanos e ônibus municipais: para que a mobilidade no Rio flua e deixe de ser um castigo para os que precisam se deslocar pela cidade, não é o caso de somente centrar esforços em campanhas de estímulo ao uso do transporte coletivo. É preciso, e muito, repensar a qualidade do transporte público.
Isso é ser realmente uma cidade sustentável. O resto, é só marketing eleitoreiro.
Foi desenvolvida para a empresa De Lijn, da Bélgica, que engloba ônibus e trens urbanos.
Veja mais no link: http://www.delijn.be/over/campagnes/imagocampagne.htm
Claro que por mais bonitinha e criativa que seja uma propaganda, ela não valerá muito (especialmente do ponto de vista da comunicação para a sustentabilidade) se o produto ou serviço em questão não tiver qualidade, oferta compatível com as necessidades da população, disponibilidade, acesso, etc.
Ou seja, autoridades, metrô carioca, trens urbanos e ônibus municipais: para que a mobilidade no Rio flua e deixe de ser um castigo para os que precisam se deslocar pela cidade, não é o caso de somente centrar esforços em campanhas de estímulo ao uso do transporte coletivo. É preciso, e muito, repensar a qualidade do transporte público.
Isso é ser realmente uma cidade sustentável. O resto, é só marketing eleitoreiro.
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terça-feira, 6 de março de 2012
O que dá sentido a um relatório de sustentabilidade?
Contexto. Isto é o que dá sentido a um relatório de sustentabilidade. A afirmação é da fundadora e presidente da consultoria norte-americana em sustentabilidade Strategic Sustainability Consulting, Jennifer Woofter, para quem a empresa não pode simplesmente relatar o que fez. Ela deve também reportar o que as ações relatadas representam na comunidade local, na indústria e no mundo de um modo geral. A consultora reforça que não é mais suficiente julgar o sucesso de iniciativas sociais e ambientais usando indicadores como "horas gastas treinando empregados" - para falar de segurança no trabalho, "litros de água consumidos" - a respeito de uso de recursos naturais, ou "milhares de dólares doados" - relacionando a filantropia ou investimento social privado. "Estes indicadores não dizem realmente sobre a efetividade de um programa ou do seu impacto relativo (positivo ou negativo)", destaca Woofter.
Embora reconheça que introduzir o contexto num relatório de sustentabilidade é uma das tarefas mais difíceis no processo, ela é fundamental para que as informações tenham sentido e não sejam apenas oportunidade de greenwashing.
Embora reconheça que introduzir o contexto num relatório de sustentabilidade é uma das tarefas mais difíceis no processo, ela é fundamental para que as informações tenham sentido e não sejam apenas oportunidade de greenwashing.
Neste momento do ano, em que muitas empresas começam a preparar seus relatórios anuais e de sustentabilidade (ou já estão até em meio à tarefa de construção destes documentos), vale a pena pensar no objetivo destas peças. Não apenas no objetivo de comunicação, mas principalmente no aspecto estratégico que deve envolver sua produção.
Para isso, uma boa leitura é o post Em ano de Rio+20 o verde lava mais branco, do Leonardo Sakamoto.
Ainda que ouçamos diariamente que sustentabilidade não é uma moda, é uma tendência; que está no DNA das organizações, etc, etc, nunca é demais pensar que sustentabilidade implica pensar o modelo de produção e não apenas divulgar fatos. E isso significa observar a empresa, sua atuação, sua presença, no seu relacionamento com seus diversos públicos. Ou seja, trocando em miúdos: analisar de verdade seu impacto dentro de um contexto.
Divulgar vários números difíceis de checar, publicar fotos tecnicamente perfeitas e esteticamente comoventes, realizar ações de lançamento eficientes, ser presença em diversas mídias sociais não basta para fazer de um relatório um instrumento de transparência e de real construção da sustentabilidade.
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Relatório,
Strategic Sustainability Consulting
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
Reportagem mostra o lado (des)humano da produção de iPads
Já faz quase um mês desde o último post... Janeiro foi mesmo um período complicado - muito trabalho, alguns dias de férias, e o blog acabou ficando meio de lado. Estou fazendo um esforço suplementar para retomar a prática de escrever neste espaço e comentar o que a mídia tem publicado em torno da sustentabilidade e da responsabilidade social.
O assunto de hoje é a reportagem de Charles Duhigg e David Barboza, do The New York Times, publicada em 27/1/2012 no Estado de São Paulo e na edição 679 do Observatório da Imprensa. Se não fosse tão sério e preocupante, o título da matéria poderia envolver trocadilhos e humor negro.
Segue na íntegra. Achei que pelo teor, era melhor reproduzir o texto inteiro que postar apenas o link.
O assunto de hoje é a reportagem de Charles Duhigg e David Barboza, do The New York Times, publicada em 27/1/2012 no Estado de São Paulo e na edição 679 do Observatório da Imprensa. Se não fosse tão sério e preocupante, o título da matéria poderia envolver trocadilhos e humor negro.
Segue na íntegra. Achei que pelo teor, era melhor reproduzir o texto inteiro que postar apenas o link.
TRABALHO DEGRADANTE
O custo humano embutido num iPad
Por Charles Duhigg e David Barboza em 31/01/2012 na edição 679
Reproduzido do Estado de S.Paulo, 27/1/2012; tradução de Terezinha Martino
A explosão arrasou o Edifício A5 numa tarde de maio do ano passado. Uma erupção de chamas torceu os tubos de metal como se fossem canudos jogados fora. Quando os operários na lanchonete correram para fora, viram uma fumaça negra saindo das janelas – era a área onde os empregados poliam milhares de estojos de iPads por dia. Duas pessoas morreram na hora e mais dez se feriram. Quando os feridos eram levados às pressas para as ambulâncias, um em particular chamava atenção. O rosto lambuzado, atingido pelo calor e a violência da explosão, deu lugar a uma pasta preta e vermelha no lugar da boca e nariz.
“Você é o pai de Lai Xiaodong?”, alguém perguntou quando o telefone tocou na casa de Lai. Seis meses antes, o jovem de 22 anos havia se mudado para Chengdu, sudoeste da China, para se tornar mais uma das milhões de peças humanas da engrenagem que move o maior, mais rápido e mais sofisticado sistema de manufatura no globo. “Ele está com problemas”, disse a pessoa do outro lado da linha ao pai de Lai, que não resistiu aos ferimentos.
Na última década, a Apple tornou-se uma das mais poderosas e bem-sucedidas empresas do mundo. A Apple e suas congêneres do setor de alta tecnologia alcançaram um ritmo de inovação jamais observado na história moderna. Contudo, os operários encarregados da montagem dos iPhones, iPads e outros aparelhos com frequência trabalham em condições terríveis, de acordo com empregados das fábricas, grupos de defesa dos trabalhadores e relatórios publicados pelas próprias companhias. Os problemas são tão variados quanto os ambientes de trabalho e os problemas de segurança – alguns mortais – são graves.
Os operários fazem horas extras excessivas, em alguns casos trabalham sete dias por semana e vivem em dormitórios superlotados. Alguns trabalham em pé por tanto tempo que suas pernas incham a ponto de quase não conseguirem andar. Empregados menores de idade ajudaram a fabricar produtos da Apple, fornecedores da companhia armazenaram inadequadamente lixo tóxico e falsificaram registros, segundo dados da empresa e grupos de defesa do trabalhador que, dentro da China, são considerados monitores independentes e confiáveis.
Mais preocupante ainda é o desprezo de alguns fornecedores pela saúde do trabalhador. Há dois anos, 137 funcionários de uma fornecedora da Apple no leste da China foram intoxicados depois de receberem ordens para usar uma substância química venenosa para limpar as telas do iPhone. No ano passado, houve duas explosões em fábricas de iPads que mataram quatro pessoas e deixaram 77 feridos. Antes mesmo dessas explosões, a Apple havia sido alertada para as condições perigosas na fábrica de Chengdu.
A Apple não é a única empresa de produtos eletrônicos que opera dentro de um sistema de suprimento preocupante. Condições terríveis de trabalho foram documentadas em fábricas de manufatura de produtos para a Dell, Hewlett-Packard, IBM, Lenovo, Motorola, Nokia, Sony, Toshiba e outras. Executivos da Apple dizem que a companhia adotou medidas importantes para melhorar as fábricas nos últimos anos. A empresa criou um código de conduta para seus fornecedores, detalhando os critérios a serem obedecidos em termos de trabalho e segurança. A empresa organizou uma campanha de auditoria. Abusos foram descobertos e correções foram exigidas.
Mas os problemas importantes continuam. Mais da metade das fornecedoras inspecionadas pela Apple violaram pelo menos uma norma do código de conduta a cada ano desde 2007, de acordo com relatórios da Apple. “A Apple nunca se preocupou com qualquer outra coisa a não ser melhorar a qualidade do produto e reduzir os custos de produção”, disse Li Mingqi, que trabalhou até abril na administração na Foxconn, uma das mais importantes parceiras da Apple na China. Li, que está processando a Foxconn por ter sido despedido, trabalhava na fábrica de Chengdu quando ocorreu a explosão.
A Apple recebeu um resumo desse artigo, mas não quis comentá-lo. A reportagem foi baseada em entrevistas com mais de 30 funcionários, antigos e atuais, e contratantes, incluindo alguns executivos com conhecimento do grupo de responsabilidade do fornecedor da Apple.
Emprego
Quando conseguiu o emprego na Foxconn, Lai Xiaodong sabia que a fábrica em Chengdu era especial. Os trabalhadores estavam produzindo o mais recente produto da Apple: o iPad.
Lai, que consertava máquinas da fábrica, logo de início notou as luzes quase ofuscantes. Os turnos eram de até 24 horas e a unidade estava sempre iluminada. A qualquer momento, havia milhares de operários em pé nas linhas de montagem, agachados perto das grandes máquinas ou correndo entre as plataformas de carga. As pernas de alguns estavam inchadas.
Cartazes nas paredes alertavam os 120 mil empregados: “Trabalhe com afinco no seu emprego hoje ou vai ter de trabalhar duro para encontrar um emprego amanhã.” O código de conduta da Apple estabelece que, salvo em circunstâncias excepcionais, os operários não devem trabalhar mais de 60 horas por semana. Mas, na Foxconn, alguns trabalhavam bem mais, segundo entrevistas, holerites e investigações de grupos independentes.
Lai logo passou a trabalhar 12 horas por dia, seis dias na semana. Havia “turnos contínuos” e então os operários recebiam ordens para trabalhar 24 horas seguidas. O grau universitário permitiu que o jovem ganhasse um salário de US$ 22 por dia, incluindo horas extras. Ao sair do trabalho, ele se recolhia num pequeno aposento, suficiente para abrigar um colchão, um guarda-roupa e uma mesa.
Essa acomodação era melhor do que muitos dormitórios da empresa, onde viviam 70 mil empregados da Foxconn, às vezes com 20 pessoas espremidas em um apartamento de três quartos. Em 2011, uma disputa sobre salários desencadeou um motim num dos dormitórios.
Em nota, a Foxconn contestou os relatos de funcionários sobre os turnos contínuos, as horas extras e as acomodações abarrotadas. Segundo a empresa, ela respeitava os códigos de conduta da Apple. “Todos os empregados da linha de montagem têm pausas regulares, incluindo uma hora para o almoço”, escreveu a companhia, afirmando que somente 5% dos empregados realizavam suas tarefas em pé.
Auditorias não inibem abusos
Em 2005, alguns executivos do alto escalão da Apple se reuniram em sua sede em Cupertino, Califórnia, para um encontro especial. Outras empresas haviam criado códigos de conduta para policiar seus fornecedores. A Apple entendeu que estava na hora de seguir o exemplo.
O código da companhia publicado naquele ano exigia que “as condições de trabalho na cadeia de suprimento da Apple sejam seguras, os trabalhadores sejam tratados com respeito e dignidade e os processos de manufatura sejam responsáveis em termos de meio ambiente”. Mas, no ano seguinte, o jornal britânico The Mail on Sunday visitou secretamente a Foxconn em Shenzen, China, onde os iPods eram fabricados, e publicou uma reportagem sobre as longas horas de trabalho a que os trabalhadores eram submetidos, obrigados a fazer flexões a título de punição, e a aglomeração nos dormitórios. Os executivos em Cupertino ficaram chocados.
A Apple realizou uma auditoria nessa fábrica, a primeira inspeção do tipo, e ordenou mudanças. Os executivos também adotaram uma série de iniciativas que incluíam um relatório de inspeção anual, o primeiro publicado em 2007. No ano passado, a Apple inspecionou 396 fábricas – de fornecedoras diretas da companhia e também muitas das empresas que fornecem para essas empresas –, um dos mais amplos programas do tipo dentro do setor eletrônico.
As auditorias revelaram graves violações do código de conduta da Apple, de acordo com resumos publicados pela empresa. Em 2007, por exemplo, das mais de 30 inspeções realizadas pela Apple, dois terços delas indicaram que os operários trabalhavam regularmente mais de 60 horas semanais. Além disso, seis “violações graves” haviam ocorrido, incluindo a contratação de menores de 15 anos, além da falsificação de registros.
Nos três anos seguintes, a Apple realizou 312 auditorias e a cada ano metade ou mais delas deixaram evidente que um grande número de empregados estava trabalhando mais de seis dias por semana e fazendo horas extras excessivas. Nesse período, descobriu 70 violações graves.
Abusos
Em 2011, a companhia realizou 229 inspeções. Foram observadas ligeiras melhoras em algumas categorias e o número de violações graves diminuiu. No entanto, 93 auditorias revelaram que pelo menos metade dos empregados continuava trabalhando mais de 60 horas por semana. Um número similar mostrou que os operários trabalhavam mais de seis dias por semana. “Se você vê o mesmo tipo de problemas, ano após ano, isso significa que a empresa está ignorando o problema, não resolvendo-o”, disse um ex-executivo da Apple.
Segundo a Apple, quando uma auditoria descobre uma violação, ela exige que os fornecedores resolvam o problema num prazo de 90 dias e realizem as mudanças para evitar que se repita. “Se um fornecedor não fizer as mudanças, encerramos nossa relação comercial”, diz a empresa no seu website.
A seriedade dessa ameaça, no entanto, não está clara. A Apple registrou violações em centenas de inspeções, mas pouco menos de 15 fornecedores foram excluídos por causa de transgressões desde 2007, segundo ex-executivos da companhia.
Explosão
No dia da explosão na fábrica de iPads, Lai Xiaodong telefonou para sua namorada, como fazia todos os dias. Ele pretendiam se encontrar naquela noite, mas o gerente de Lai convocou-o para fazer hora extra, ele disse. Lai tinha sido promovido na Foxconn e depois de apenas cinco meses ficou encarregado da equipe de manutenção das máquinas polidoras dos estojos dos iPads.
A atividade na fábrica era frenética, disseram os empregados. Máquinas em fila poliam os estojos, enquanto os empregados de máscara apertavam os botões. Um grande duto de ventilação pairava sobre cada estação de trabalho, mas os ventiladores não davam conta das três fileiras de máquinas polindo sem parar. Havia pó de alumínio por toda parte. O pó é um conhecido risco à segurança.
Duas horas depois que Lai já estava no seu segundo turno, o prédio começou a tremer, como se um terremoto estivesse ocorrendo. Houve uma série de explosões, disseram os operários. Quatro pessoas morreram e 18 se feriram. No hospital, a namorada de Lai viu que havia queimaduras na sua pele. Finalmente, sua família chegou. Mais de 90% do seu corpo tinha sido queimado.
Depois que Lai morreu, os trabalhadores da Foxconn foram à cidade natal dele levando uma urna com suas cinzas. A família recebeu US$ 150 mil. Num comunicado, a Foxconn, disse que no momento da explosão, a fábrica estava cumprindo com todas as normas e leis.
No seu mais recente relatório sobre a responsabilidade dos fornecedores, a Apple disse que, após a explosão, a empresa entrou em contato com os “mais destacados especialistas em segurança de processos industriais” e montou uma equipe para investigar e fazer recomendações para prevenir acidentes.
Em dezembro, porém, sete meses após a explosão que matou Lai, uma outra fábrica de iPad explodiu, desta vez em Xangai. Novamente, o pó de alumínio foi a causa, de acordo com entrevistas realizadas e o relatório da Apple. A explosão provocou ferimentos em 59 operários, 23 foram hospitalizados.
Em seu mais recente relatório, a Apple escreveu que, embora as duas explosões tenham envolvido o pó de alumínio, as causas das explosões foram distintas. Mas não forneceu mais detalhes.
Para a família de Lai, uma pergunta persiste. “Não sabemos ainda com certeza por que ele morreu”, diz a mãe de Lai, de pé ao lado de um pequeno oratório próximo da sua casa. “Não entendemos o que ocorreu.”
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[Charles Duhigg e David Barboza, do New York Times]
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