O que eu quero comentar é um ponto que me causou um tremendo incômodo: em praticamente todas as fotos de mesas da conferência, lá estava ela, a indefectível, a onipresente garrafinha de água mineral.
Secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon |
Secretário geral da Rio+20 Sha-Zukang |
Ministro das Relações Internacionais, Alexandre Patriota, e Ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira |
Luiz Alberto Figueiredo Machado, Negociador Chefe Brasileiro na Rio + 20, foto de Maria Elisa Franco. |
Claro que todos os participantes da conferência precisavam beber água. Mas precisava ser de garrafa PET? Por que não distribuir, juntamente com as ecobags, no momento do credenciamento dos delegados, um copo de uso individual e permanente, que não fosse virar lixo imediatamente após seu uso? Campeonatos de surf no mundo inteiro adotam esta prática. Como não se pensou em nada semelhante na Rio+20?
(Em algumas reuniões, se podia vislumbrar garrafas de vidro ou jarras de água, como na abertura oficial da conferência. O que impediu que esta prática fosse geral no evento? )
Claro que se pode contra-argumentar que seria muito deselegante cada membro das delegações com seu copinho na mão. Depende do ponto de vista e do que se considera elegância. Não é muito mais deselegante uma garrafa PET de água mineral, com tudo o que ela representa em termos de agressão ao meio ambiente, excesso de consumo, complexidade de tratamento dos resíduos sólidos produzidos pela ação do homem, mercantilização da água, um bem que deve ser comum a todos e vem se tornando uma mercadoria de alto valor internacional, etc, etc, etc?
Toda esta situação nos pontua o quanto a questão da sustentabilidade envolve, também, a mudança de comportamentos e prática culturais. Comportamentos que sem dúvida foram aprendidos ao longo do tempo - só pra ficar num exemplo, quando a ONU foi criada não se servia água em garrafas pet nas reuniões e assembleias... - e que parecem estar profundamente arraigados em nosso cotidiano, seja porque nos trouxeram comodidade, praticidade ou até mesmo por terem barateado o acesso da população a alguns produtos.
Sempre defendo que a sustentabilidade não pode ser uma tarefa jogada no colo do indivíduo, pois o consumo (ou o não-consumo) são apenas a ponta do processo que começa com o uso da matéria-prima e passa essencialmente pela produção. Não estou, portanto, me contradizendo, mas apenas mostrando como, quando precisamos pensar coletivamente, a questão comportamental parece escoar pelo ralo. Ou ficar retida na tampinha da garrafa de plástico. Será que a organização da Rio+20 dirá à sociedade quantas garrafas PET foram utilizadas durante a conferência? E qual o destino dos frascos depois da sua utilização?
Terão sido todos doados para a instalação feita durante a Rio +20 pelo artista Vik Muniz, curiosamente patrocinado por uma das empresas que mais produz resíduos em forma de PET?
Reciclar é a fase final da sequência de atividades recomendadas quando utilizamos objetos, de maneira a reduzir seu impacto no meio ambiente. A sequência inicia com reduzir, segue com reutilização e fecha com a reciclagem.
Curiosamente, quando damos tanta visibilidade à reciclagem, me soa como se nos sentíssemos desobrigados de cumprir as etapas anteriores, que provavelmente são aquelas que provocam a maior mudança tanto de mentalidade quanto de hábitos. Infelizmente, pelo que as fotos nos mostram, esta dificuldade também esteve presente na Rio+20.